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PINTOR, POETA E CANTOR, OU FAZEDOR DE COISAS LINDAS COM AS DUAS MÃOS E NÃO SÓ.

terça-feira, 18 de julho de 2006

LONGEVO AQUELE AMOR ENTRE A ROSA E O MALMEQUER

Ela e ele. Ele e ela. Um casal de velhos. Já terão morrido há uns anos. Deviam ter, na ocasião, mais ou menos mesma a idade que eu tenho hoje: quase sessenta. E eu não era mais que um miúdo, mas já atento àqueles factos que me parecessem fora do comum. E o curioso, neste caso na berlinda, é que eles eram namorados desde há décadas. Duas ou três. Sem avanços. Sem trepadelas de muros. Sem sequer um beijo dado fora do contexto de um namorico que se preze de ser sério. Ela, à janela. Ele, na rua.
Ele ia, de bicicleta, bater-lhe à porta, levando uma rosa por detrás da orelha. E ela atendia-o de lá de cima, com um malmequer nos cabelos, abrindo a janela. E ali se quedavam eles, a conversar durante horas e horas, delineando projectos de vida comungada a levar à prática, um dia, ou amparando sonhos velhos com novos sonhos em cada jornada de amor. Acreditando com todo o pundonor naquele seu sentimento quase tão antigo como eles. Ele, na rua. Ela, à janela.
Não sei o que depois veio a ser deles. Se se mantiveram enamorados até que a morte os levou. Ou se chegaram a consumar alguns planos, entre os tantos traçados ali à porta de casa, quando ele aparecia com a rosa na orelha, para que o malmequer, sempre à janela, o atendesse, e ele, sempre na rua, lhe garantisse uma total entrega à construção do seu ninho noutra árvore, não aquela, onde só haveria uma rua e uma janela, para ele e para ela.
Só que ela adorava, ao que corria, aquela sua janela. E ele é que não parecia encarar lá muito bem a perspectiva de se ver na rua por mais vinte ou trinta anos. E quantos é que não se terão passado, com ele, a rosa, na rua, encostado à bicicleta, e ela, o malmequer, tão lá em cima, no peitoril da janela?