GUIÃES, ENTRE A CIDADE E AS SERRAS QUE O EÇA CALCORREOU (VII)
Parente paupérrima da neve, embora próxima, talvez gémea falsa fora da graça e dos livros, também não deixará de ter o seu encanto, alva e leve, cristalina, mais ruim que benfazeja, a geada. Subsiste apenas até que o sol a persuada a abandonar as malignas pretensões de corrosão para outro dia. Que quanto sem ela adormeça se livre de acordar com a malvada espojada no mesmo leito. Mas dizem os velhos entendidos nesses contextos que a geada também tem virtudes. É proveitosa, por exemplo, porque impede as árvores e as plantações em geral, viciadas até então por temperaturas benévolas fora do tempo, de deitar folhas e flores com demasiada celeridade, como se a hora das invernias já lá fosse e os dias já se ataviassem para a apoteose primaveril. E também se proclama como vantajosa porque amansa nos cascos o vinho novo, dando-lhe enfim corpo e alma atestáveis nos estalos da língua. E terá ainda utilidade de grande monta, dizem as velhas entendidas noutros contextos de outra caldeação, porque consegue amarrar os velhos em casa muito mais tempo, acocorados sob a regência da lareira, sóbrios ou de penca pendente e a pingar no brasido, pouco lhes importará, às velhas, obrigadas a dormir com o que reste.
Útil será, será bela, a geada. Mas só ao longe, ou nem isso.
Útil será, será bela, a geada. Mas só ao longe, ou nem isso.
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