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PINTOR, POETA E CANTOR, OU FAZEDOR DE COISAS LINDAS COM AS DUAS MÃOS E NÃO SÓ.

quinta-feira, 15 de maio de 2008

ONDE E QUANDO UM PORCO SUJO GOSTARIA DE CONTINUAR A SER CÃO

O porco, desta vez, saltou mesmo a vedação e invadiu a seara alheia, onde o chão é sagrado. Mas não irá longe. Logo a própria gula o fará tropeçar na própria sombra e dar com os dentes no charco da merda por ele produzida. Os porcos são assim. Por isso são porcos. Alguém lhes adjectivou o nome e o lançou por aí, à disposição de quem deles sofra os efeitos da graveolência, inata ou adquirida, que importa?
O porco tem uns olhos pequenininhos e tudo dimensiona em função dessa sua pequenez visual. Só ele é grande, o porco. Um gigante. Um príncipe caído de qualquer asteróide fora dos catálogos. E quão belo ele é! Os outros? Quais outros? Que espécime de raça menor ousaria atribuir-se o porte e a graça de sua majestade cheirante? É que ele, o porco, fede mesmo, não se sabe a quê. A algo entre dentes podres por corrosão de sémen vadio e cuecas nunca despidas em quinze dias ou mais. Tão gratificante deve ser o ser-se porco!...
O porco, desde antes de antanho, é um cobarde. Um porco incendiou Roma. Outro, com outros, foi criador do santo ofício. Outro, declarou guerra aos judeus e não os matou a todos. E este, porque é doente, ou tal se finge coitadinho!— e disso obtém proventos, pensa-se a salvo de prestar contas pela enxúndia que por ele foi derramada. Qualquer pretexto lhe dá vento e o faz inchar (se até ascendeu a especialista em flatulência mental), servindo-se então de preconceitos, dor de corno e demais escorrências de etílica coloração, se ressabiadas e apuradas por via de infusão em vinha-d’alhos a título permanente, para alagar o curro onde é seu mester alapar-se. Ora, porque o mundo é pequeno e o tempo de espera é infinito, utópico será que ele se julgue, o porco, imune à justa sanção de quanto ousou fazer eco (e é um facto que os roncos se percebem bem à distância), até à última sílaba.
Há porcos a andar, no circo, de bicicleta. E há porcos actores, na tela e no palco, protagonistas de peças, filmes e séries televisivas. E há os porcos que escrevem, e bem, e se proclamam poetas, grandalhões da língua portuguesa, e até publicam livros. Só é pena serem tão porcos, nem mais, todos os dias.
Na quintarola pelo porco invadida, anda um burro, um velho jerico, a pastar. Também ele, em gastas eras de insensatez e leviandade, se viu a braços com a prepotência de alguém que o nome lhe açambarcou e repôs como adjectivo. Assaz injusto diga-se —, neste caso. O burro nem é (proclamam os livros) burro nenhum, não senhor. E este, sem prestar grande atenção ao mosquedo, vem registando os ziguezagues do porco, o teor dos grunhidos e o que mais importe registar, por via das contas no fim, em invasões deste género.
“Deixá-lo vir, deixá-lo”— diz o burro velho ao próprio ouvido —,“que eu tratarei da saúde ao doentinho”.

N.A.— Em abono da verdade, cumpre-me informar que o porco em causa, embora pertencendo à classe dos Mamíferos, nada tem a ver com a ordem dos Artiodáctilos, subordem dos Bunodontes, família dos Suídeos. Será, por estranho que pareça, um primata. Bem como o asno velho, ao fundo, que pasta não longe de mais.