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PINTOR, POETA E CANTOR, OU FAZEDOR DE COISAS LINDAS COM AS DUAS MÃOS E NÃO SÓ.

sábado, 18 de novembro de 2006

SE QUERES FIADO TOMA MONOCROMÁTICO OU MENOS

Amanheci cinzento, embora com laivos de sol tímido, triste. Talvez o dia se me recomponha através dos processos habituais em quem ame o amanhecer, cinzento ou rubro, arteiro ou envergonhado. Nada é tão confrangedor como acordar com ideias turvas e não ter um sol capaz de lhes dar cor, contraste, textura, transparência, asas.
Entretanto, o vento, cão e pastor, vai juntando as nuvens em rebanho sobre a pastagem perceptível à distância de meia hora ou nem tanto, como se toda a descoloração infligida não constituísse alimento mais que bastante à turbação das ideias. E chia, o canalha. E faz remoinhos e arabescos no arvoredo, o pedante, garboso do escárnio sem antídoto capaz de o combater e devolver aos primórdios que o pariram.
Eu gosto do vento, todavia. Gostei sempre. Leva-me pela mão até ao feno e aos silveirões dos montes na meninice, até aos carreiros de pé descalço e topadas de faltar o ar, até aos pânicos da noite em que me amanheciam os dias, até ao crime de dizer mal dele por estratagema de recurso ante a ameaça de mudez lida nos ecos.
Quem me dera que o vento também gostasse de mim, quando contra ele levanto os braços num belo manguito à portuguesa, que o mesmo é dizer à Bordalo, senhor do traço e do barro, que não lama, em que à nossa exacta dimensão nos reduziu.