http://photos1.blogger.com/blogger/4837/2733/1600/moi4.jpg
A minha foto
Nome:
Localização: Coimbra, Portugal

PINTOR, POETA E CANTOR, OU FAZEDOR DE COISAS LINDAS COM AS DUAS MÃOS E NÃO SÓ.

domingo, 11 de junho de 2006

HEROES DO MAR, NOBRE POVO, NAÇÃO VALENTE, IMMORTAL

É difícil de imaginar uma aventura que não tenha heróis. Há-de haver sempre um, no mínimo. E sobre ele recairão os holofotes da atenção de quem goste de viver aventuras ao serão, depois da ceia, entre dois tragos daquela velhinha de muitas décadas a dormir, engarrafada sem rótulo e resguardada no meio de teias de aranha e fuligem de velhice semelhante em tudo. Até nos efeitos de ilucidez consentida.
Herói, aliás, qualquer um poderá ser. Nos tempos que ora decorrem, basta estar vivo. E por isso, ninguém se pasmará até aos forros, se de repente um extraterrestre se lhe meter portas adentro de microfone em punho, batendo-se pelo furo da reportagem em directo, da notícia a transmitir em primeiríssima mão, para todo o infinito passível de se compartimentar e dar a comer através do ecrã.
E quem diz um extraterrestre, diz uma dessas coisas seriíssimas, sem pés-de-galinha ou demais rugas vadias pescoço acima, que começam e terminam em capas de revista a nunca ler além da capa. Então não apetece mesmo ser herói e dar entrevistas e tudo a uma coisa dessas, a mamar olhos ou a olhar mamas ali tão pedintes como generosas?
Haja crianças que se dependurem de altas janelas, velhos moucos que atravessem linhas férreas à hora exacta, senhoras cuja cachorrinha se perca de amores por algum rafeiro e marche atrelada, turistas a nadar em águas proibidas pelo bom senso, alpinistas sem corda que lhes dê para desistir da escalada e regressar ao sopé devagarinho, feras enfim libertas das grades do circo e dos aplausos ao seu domador, incêndios que venham esturrando prédios com águas-furtadas cheias de mãos a gritar, mineiros soterrados pela desdita de já terem vindo ao mundo como mineiros e órfãos, cegos sem cachorro nem bengala nas horas de ponta, mudos a perorar por instalações sanitárias sob compressão diarreica, cadastrados evadidos a nado pelas tubagens do esgoto, ou náufragos de botifarras de borracha calçadas a cinquenta metros de terra firme, onde há mulheres velhas e novas e arrepelões e preces tudo à mistura num molho. Haja a iminência de desastres, naturais ou fabricados pela incúria, que heróis na medida certa hão-de aparecer e fazer-se ouvir em horário nobre.
E haja então entrevistadoras cujas medidas se imponham aos olhos de qualquer herói cujo feito nem nos interesse assim tanto, afinal.